quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

A cal e os homens

Entre considerações sobre o desenvolvimento económico e social do país no tomo I d'As Farpas, com o cenário pessimista que sempre fazem os desta poderosa escola a que Ramalho Ortigão diz pertencer (a dos bota-abaixo), encontramos um comentário curioso sobre a cal e a limpeza dos homens.

Por nenhum dinheiro no mundo um alentejano, um estremenho ou um algarvio entraria nu em uma latrina como fazem os minhotos para o negócio do estrume. Basta comparar as habitações alentejanas, esmeradamente asseadas, com os chiqueiros das famílias pobres do Minho.
- É porque no Minho não há cal.
- Mandem-na vir!
- É o que eles fazem; mas como a cal não está no solo o asseio não está nos costumes. Olhe Afife, como é uma povoação asseada! Porquê? Porque os de Afife são todos estucadores: é a especialidade da profissão que os familiriariza com a cal. Onde a casa é negra o homem é sujo.
- O senhor cuida então que o que falta no Minho é cal? Pois eu entendo que o que lá falta é gente. A população do minho é uma população de refugo. A emigração é um agente selectivo exercendo-se no sentido de operar a decadência. O minhoto mais forte, mais robusto e mais inteligente vai para o Brasil...
- Enriquecer!
- Sim; enriquecer o Brasil com a sua inteligência e com o seu trabalho, e empobrecer a sua terra pela ausência da sua capacidade e da sua força no conflito da civilização local.
(...)

Aqui encontramos duas questões pertinentes, uma da relação da cal com o asseio, que é muito sugestiva para os níveis da limpeza em grande parte do mundo - apesar de remotamente válida. A outra diz respeito ao efeito da emigração e ao engano que é acreditar que o dinheiro de algibeira proveniente dos emigrantes traz desenvolvimento às regiões. As minhas recentes impressões sobre o Minho são a da continuidade da pobreza relativa, noutro patamar é claro. Quando as regiões se esvaem em gente só podem contar com a falta de vigor para toda a acção, não há arremesso de dinheiro que traga desenvolvimento. Acrescente-se que este mal não é característico do Minho, é um mal das nossas províncias nos diferentes pontos do espaço e do tempo.

Para quê ler os jornais se As Fartas nos fornecem informação ainda mais actual?

1 comentário:

ESTUQUES DECORATIVOS disse...

olha que eu sou de Afife ...cuidado !!!! Cuidado ..os tempos agora são outros !!!
tudo muda !!! o que acho fantastico é são as profissões pasados anos ainda se mantém !!
Afife é a capital do estuque !